Desde o início, João Emanuel Carneiro deixou clara sua
intenção de fazer de Romero Romulo um sujeito dúbio que vaga entre os limites
do bem e do mal. Começou sua história numa fundação de fachada, onde ele usava
a desculpa de recuperar ex-presidiários para desviar recursos para a facção
criminosa da qual é membro. A máscara de cara do bem, capaz de regenerar os
mais pesados corações tornava Romero um personagem entregue ao mau caratismo, porém com nuances de uma
inocência infantilizada, quando se esbaldava em frente ao espelho de sua
cobertura ao som de Elvis Presley.
Quase 120 capítulos depois, Romero agora é vítima da própria
mentira. O feitiço virou contra o feiticeiro, e o sujeito que antes mentia sobre
regenerar os necessitados, hoje tenta regenerar a si mesmo.
Numa quase típica crise de meia idade, o ex-vereador
questiona se o dinheiro desviado de criancinhas carentes é suficiente para preencher
sua vida vazia regada a mulheres pagas e luxos soberbos. Tem culpa na
consciência, mas não consegue se ver livre do estilo de vida que sempre levou.
A bondade passou a ser uma virtude inalcançável a essa altura, por isso,
desejada por um cara que conquistou tudo o que quis (materialmente).
Uma das grandes responsáveis por manter Romero no crime
(além de seu próprio ego e carência) é Atena. A estelionatária que cresceu nas
ruas, sozinha, passando todo tipo de humilhação e necessidade, hoje acredita que
foi recompensada pela vida. Em sua visão torta, ela tem todo direito de
usufruir de bens roubados já que sua infância e dignidade também lhe foram
roubadas. Ama o dinheiro e seus
benefícios, pois aprendeu a sobreviver somente dele.
Romero não consegue se ver livre de Atena, e por mais que
ela se utilize de chantagens baratas para tê-lo, ambos sabem que o motivo real
de sua relação é o sentimento mútuo que nutrem um pelo outro. O que passa a
incomodar os telespectadores é justamente o modo frio como Romero insiste em
tratar Atena mesmo após ele ter declarado o que sente pela parceira que salvou
sua vida.
O amor de Romero por Atena, mesmo que oculto ao próprio ver,
o impossibilita de recomeçar a vida em novo estilo ao lado da mulher que ele
julga adequada. E, cético, ele enxerga sua salvação na bondade que quer
praticar, enquanto Atena só encontra validez para sua vida no amor que sente
por ele. A bondade dela é sentimental, a dele é racional.
Existem ainda virtudes sobre si mesmos que os próprios
desconhecem. Atena, por exemplo, não precisa ser amada para doar amor. Não só
com Romero, ela também foi protetora com Tóia quando ambas estavam em situação
de risco. Ela é amiga do Ascânio e leal ao que diz. Inteligente, divertida e
destemida. Enquanto Romero tem muito mais motivos para odiar sua própria
personalidade, mas ganha créditos por freqüentemente arrepender-se do que
faz e tentar consertar suas burradas, basta que ele aceite seus próprios
sentimentos para conseguir colocar as coisas no eixo correto.
Resta aos dois perceberem que o dinheiro alimentou seus egos
durante toda a vida, mas que agora eles têm algo capaz de preencher todo o
vazio afetivo pelo qual sofreram e recomeçarem suas histórias juntos, no crime
ou na integridade.